Era aqui nesse lugar
Uma linda história!
Já no final dos anos 70, eu estudava no Colégio Deocleciano Barbosa de Castro, e quando voltava pra casa, perto do meio dia, passava na Praça da Matriz e lá ficava admirando o trabalho dos Hippies, (jovens revolucionários de um movimento de protesto), que naquela época eram muitos e permaneciam ali fazendo pulseiras, brincos, anéis e um montão desses tipos de coisas.
Os objetos prontos eram dispostos à venda, em placas de papelão forradas de pano preto onde, principalmente, as meninas fuçavam até que acabavam comprando alguma coisa.
Era comum uma grande quantidade de estudantes aparecer por lá com o mesmo objetivo.
Eu ficava encantado com a praticidade de um dos Hippies.
Apesar de não lembrar mais o nome, ainda sou capaz de descrevê-lo: um cara alto, magro, sandálias de couro, roupa bem folgada, cabelos longos e amarrados com uma fita vermelha passando pela testa.
Ele não gostava muito de falar, mas sempre me aproximava dele exatamente porque admirava a agilidade como manobrava a ponta de um alicate dando formato aos brincos e pulseiras.
Várias foram as vezes e os dias em que sentei no chão da praça e permaneci ali durante horas observando. Até que, em um desses dias, aconteceu algo que ficou marcado para sempre em minha vida.
Lembro-me como se fosse agora: o Hippie, que jamais havia me dado atenção, após terminar de trançar uma pulseira, entregou-me o feito e disse: “observe bem os pontos trançados dessa pulseira Guri!”
Fiquei meio estático, afinal era a primeira vez, em quase um ano, que o cara falava comigo. Demorei a reagir, ele, abriu um tímido sorriso, e voltou a insistir: “pegue Guri! Veja e me diga o que você acha que é isso que acabei de fazer?”
Finalmente estendi a mão e peguei a pulseira. Fiquei olhando detalhadamente cada volta que aqueles fios davam, um sobre o outro! Uma magia, quando se sabia que aquilo havia sido feito apenas com a ponta de um alicate comum e de maneira bem célere.
Demorei em responder e o Hippie voltou a me cobrar: “vamos Guri, me diz o que você acha que é isso ai que acabei de fazer?”. Ainda tímido, resolvi arriscar uma resposta: “Cara, eu acho que isso aqui é o que pode ser chamado de arte”!
Ele sorriu largamente (uma das poucas vezes que o vi sorrindo), pegou a pulseira de volta e me disse: “Guri, então quer dizer que você pensa que sabe o que é arte? Pois eu vou te mostrar agora o que é arte!”. Fiquei meio sem entender, onde ele queria chegar, mas confesso que a curiosidade foi maior que a expectativa e antes que eu terminasse de pedir melhor explicação, o Hippie subiu num dos bancos da praça, (vi que ele estava procurando algo em uma das árvores que ficavam enfileiradas margeando a rua, bem em frente a onde hoje é uma Locadora de Vídeos e o escritório da EBDA), tirou algumas folhas, depois fez um gesto como se quisesse que eu visse o que ele tinha nas mãos, depois começou a enrolar uma das folhas, (como se tivesse fazendo um cigarro), pegou uma tesoura, (era usada para o corte no trabalho), e cortou uma das folhas fazendo uma espécie de pequena tira, e mostrando-me novamente, agregou a tira dentro do tubo de folhas que havia feito antes.
O objeto natural virou uma espécie de apito. Como se quisesse fazer um ritual fez um tipo de saudação chinesa pra mim, (curvando o corpo a frente), depois levou aquele apito à boca, fechou os olhos, e começou a soprar dando formas à mais linda canção em todos os seus tons, que eu já ouvi em minha vida.
Por uns três minutos fiquei ali parado, impressionado, ouvindo, encantado com o som puro e harmonioso que saía daquele apito de folhas.
Ao terminar o sopro musical, o Hippie voltou a fazer o gesto de saudação chinesa e disse: “Tá vendo Guri? Isso que é arte! Não esquece isso nunca! Se alguém, algum dia, te perguntar, se você sabe o que é arte, conte esta história”.
Um dia a Revolução dos Hippies acabou e não sei pra onde ele foi. Mas ficou marcado pra sempre aquele show em minha mente.
1997, cerca de 25 anos depois do fato, já trabalhando como radialista na Jacobina FM. Eu procurava, num final de tarde, uma música para colocar de fundo (que chamamos tecnicamente de background), numas declamações de mensagens de otimismo em defesa da vida que iria fazer durante a apresentação de um programa especial. Lendo umas capas de CDs achei um título que me chamou a atenção: “Dolannes Melody”! Pensei: gostei do título! Resolvi colocar pra tocar. Ao ouvir, foi inevitável!!! Uma lágrima saiu dos meus olhos! Foi mágico! A mente, de forma instantânea, me trouxe de volta à cena! Era exatamente a música que o Hippie havia tocado no apito de folhas há quase 25 anos!!!
CC:
“A beleza e o sentido da vida, muitas vezes, estão nos mínimos detalhes! Observe bem, porque pequenas cenas podem valer mais que filmes inteiros”
José Carlos Benigno
02.11.07
sábado, dezembro 29, 2007
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
olá Zé carlos tudo bem não é ? olha passei aqui só pra te desejar muito sucesso aí por ourolândia e ao mesmo tempo lamentar e te dizer o quanto sentimos tua falta aqui no nosso meio jornalistico,a como lamentamos a tua saida do radio jacobinense coisa que só você sabe fazer.Olha infelizmente boa parte das pessoas boas foram saindo de jacobina e hoge tá essa m..... que tá, mais valeu meu amigo,muito sucesso é o que te desejo afinal ourolândia precisa de homens assim como você parabéns pelo seu blog,um abraço do amigo Robério pires.
Postar um comentário